Outono nas ilhas Lofoten, o paraíso do Ártico

Lofoten (Noruega), setembro de 2016

Depois da Islândia, as Lofoten são, na Europa, um lugar obrigatório para todos os apaixonados pela fotografia de paisagem e por caminhadas em montanha. Já no Círculo Polar Ártico, partindo de Lisboa, são precisos três voos para lá chegar. A beleza natural compensa, mas prepare-se para o frio.


Está longe de ser um destino conhecido da maior parte dos portugueses, ou mesmo dos europeus. Fica muito lá em cima e é bastante frio. As ilhas Lofoten, situadas na região de Nordland da Noruega, ficam próximas da Lapónia, já no Círculo Polar Ártico. E praticamente não encontrará turistas. Pelo menos, foi assim no mês de setembro.

Escolhi este mês devido à variedade de cores oferecidas pelo outono. As florestas ganham diferentes tons; a noite regressa e as auroras boreais são novamente visíveis e pintam o céu de verde. A subida íngreme e escorregadia até ao topo de Reinebringen, desaconselhada pelas autoridades, foi o momento alto desta viagem, tanto no sentido figurado como literal. Proporcionou uma vista fabulosa num daqueles raros dias em que não se avistou uma nuvem. Foram 10 dias neste lugar idílico, cujo trajeto passou por Leknes, Svolvaer, Ramberg, Reine, Å e a belíssima ilha de Hamnøya.

E como se chega lá? São precisos três voos partindo de Lisboa

Esta foi a primeira pergunta que me assaltou quando pensei neste destino. Mas até nem é complicado responder: são três voos partindo de Lisboa. De Lisboa até Oslo, de Oslo para Bodo e daqui para Leknes, já no coração das Lofoten. Foi fácil conseguir os três voos no mesmo dia, mas foi todo o dia em viagem. Leknes é uma pequena cidade com um pequeno aeroporto para os voos domésticos. A chegada ao aeroporto de Leknes foi já bastante tarde, mas o carro da empresa de rent-a-car estava no estacionamento do aeroporto com as portas abertas e a chave no carro. Muita tranquilidade e segurança são as primeiras percepções. E muito frio. Mesmo muito, especialmente para o mês de setembro, tal como o conhecemos. 

Será a E10 uma das mais belas estradas do mundo? Provavelmente sim!

Nos confins da Noruega, impõem-se estas privilegiadas ilhas que apresentam alguns cenários fascinantes de fiordes. São formadas por seis grandes ilhas: Austvågøy, Vestvågøy, Flakstadøy, Moskenesøy, Værøy, Røst e por inúmeras mais pequenas. A passagem entre elas é feita por pontes e túneis. Ao longo da estrada, as paisagens são arrebatadoras e erguem-se montanhas como muralhas. A estrada E10 percorre o arquipélago de uma ponta à outra: são cerca de 300 quilómetros e é certamente uma das mais longas e belas estradas do mundo. No outono, a diversidade de cores na vegetação que nos assalta à vista ao longo da estrada, dos amarelos das ervas que secam, até plantas coloridas de espécies que nunca tinha visto. Também as florestas vão-se libertando dos tons verdes e vestindo os amarelos e laranja. Ver aqui o mapa

Para a frente e para trás: de Leknes a Svolvaer e de Svolvaer a Reine

As distâncias são curtas e uma semana é suficiente para explorar as Lofoten. No dia a seguir à chegada a Leknes, algumas dezenas de quilómetros até Svolvaer, para explorar esta pequena cidade portuária. Por aqui, todas as cidades são pequenas. Pelo caminho, a paisagem é verde, muito diversificada, e as florestas começam a pintar-se de tons amarelados porque o outono estava a chegar. 

Dois dias em Svolvaer, mas num deles choveu quase todo o dia. Não posso dizer que Svolvaer seja uma cidade muito apelativa. É uma cidade portuária com o turismo a crescer, pois passam por aqui alguns cruzeiros do mar do norte. A memória que primeiro me assalta é do confortável hotel, com o quarto todo envidraçado e vista para a praça principal. Destaco ainda os magníficos pequenos almoços do Thon Hotel Lofoten

Depois de alguns percursos perto de Svolvaer, retomei a E10 e voltei para trás, passando novamente por Leknes, em direção a Reine para 5 dias naquela que é a jóia das Lofoten.

Entre nuvens, nevoeiro, fiordes, vegetação rasteira de tons amarelados, musgo e praias desertas, são distintos e dramáticos os cenários que pode encontrar percorrendo a estrada E10. Altas montanhas, os fiordes que entram pelo mar. Um local em perfeito equilíbrio entre o homem e a natureza.

Reine é mesmo a cidade rainha das Lofoten

Reine é um lugar muito especial, de rara beleza; provavelmente um dos segredos mais bem guardados do hemisfério norte. E como fiquei aqui vários dias optei por dividir as noites em duas cabanas, localizadas em pontos diferentes. O objetivo foi o de conhecer melhor esta pequena cidade, usufruindo de diferentes perspectivas. 

Reine é composta por pequenas ilhas com pontes a fazer a ligação e estradas que as atravessam. Sem dúvida que é a localidade mais bela das Lofoten e poderá fazer muitos passeios pelas montanhas próximas e algumas praias. 

Há um supermercado, mas prepare a carteira, pois está na Noruega. Por aqui, uma cerveja de lata custa, mais ou menos, 5 euros.

Reine é uma vila de pescadores e centro administrativo do município de Moskenes. Está localizada na ilha de Moskenesøya, a cerca de 300 quilómetros de Tromsø. Tem uma população que não chega a 400 habitantes. Reine é um porto comercial desde 1743. Hoje, o turismo é importante e, apesar de sua localização remota, milhares de pessoas passam por aqui anualmente. Situa-se quase no final da E10, que atravessa as Lofoten. Já foi classificada como a mais bela localidade da Noruega.

A pequena ilha de Hamnøya

É provavelmente um dos lugares mais fotografados das Lofoten. As primeiras noites em Reine foram precisamente nesta ilha, logo à chegada, na cabana 23 de Eliassen Rorbuer. Estas cabanas vermelhas colocadas em cima da rocha são muito confortáveis, com cozinhas equipadas e salas mobiladas e bem acolhedoras. É um local idílico, tranquilo. Não há muito para fazer por aqui, a não ser contemplar a beleza natural.

É daqui que vem o bacalhau

O arquipélago das Lofoten está localizado entre os paralelos 67º e 68º norte, na Noruega, já no Círculo Polar Ártico. É conhecido pela sua extraordinária beleza natural e por ser um grande centro de pesca de bacalhau. Há mais de mil anos que as ilhas têm sido um grande centro piscatório de bacalhau, nomeadamente no inverno, quando os cardumes deste peixe migram através do Mar de Barents e se concentram nas Lofoten para procriar.

A cabana de Reine Rorbuer e a minha primeira aurora

Depois de três noites na primeira cabana, mudei-me para o centro de Reine, para a cabana número 22 de Reine Rorbuer. Foi numa das janelas desta cabana que fotografei a minha primeira aurora boreal. Finalmente uma noite limpa, com luar. Apesar do frio, com o tripé montado ora à porta da cabana, ora na janela do quarto virada para a água, fui aguardando pelas luzes do norte. Foi entre a meia noite e as 2 da manhã que o céu se coloriu. 

Primeiro surge uma nuvem em forma de linha que se move lentamente. As cores esverdeadas são difíceis de perceber. Só através da longa exposição percebi que era realmente uma aurora. Aos poucos vai-se intensificando e ocasionalmente com momentos mais intensos em que durante alguns segundos as luzes dançavam nos céus, com cores bem fortes. Um espetáculo difícil de esquecer. E depois disso quem é que consegue dormir?

Foi nas Lofoten, em Reine, na cabana 22 de Reine Rorbuer, que fiz as minhas primeiras fotografias de auroras boreais. 
Foram duas noites inesquecíveis. O mais difícil era adormecer sabendo que as luzes dançantes poderiam regressar.

O drone também foi e até subiu montanhas

Não foi nada fácil fotografar com drone por aqui e a principal razão foram as condições climatéricas. Em muitos dias esteve chuva e, nos dias em que não choveu, estava vento. Em apenas dois ou três dias foi possível por o drone a voar e consegui fazer alguns registos aéreos de Reine, nomeadamente na ilha de Hamnøya. Até levei o drone na escalada a Reinebringen, mas depois de uma subida tão íngreme, ao chegar ao topo estava com as pernas a tremer de cansaço; e a sensação de vertigem também não ajudou.

Praias paradisiacas, desertas... mas geladas

As ilhas Lofoten estão repletas de praias de enorme beleza, com água transparente e enormes areais. Mas... as temperaturas é que não convidam ao banho. Esta (fotografia em baixo), em Ramberg, fica a poucos quilómetros de Reine.

Reinebringen, uma subida (e descida) para nunca mais esquecer

Não, não se sobe de teleférico; nem de escadas. A montanha tem menos de 500 metros de altura, mas o caminho está longe de ser em linha reta e... fácil. São alguns quilómetros a andar de quatro, sobre pedras, lama e rocha escorregadia, a uma inclinação muito elevada. E o que leva tanta gente a subir esta montanha? A vista.

Subir ao topo de Reinebringen é um dos percursos perigosos das ilhas Lofoten, até desaconselhado pelas autoridades. Na altura da minha viagem estava a ser criado um trilho com escadas, mas ainda no começo. A maior parte do caminho é uma escalada árdua que levará horas. Durante a subida, os aventureiros que desciam iam sorrindo e dizendo "está quase", "falta pouco", "são mais 10 minutos" ou "é já ali!"... mas nunca era. E quando finalmente cheguei ao topo, as pernas tremiam. A vista é soberba, mas vertiginosa.

As fotografias em baixo devem ter sido das mais difíceis de conseguir nesta viagem. O esforço necessário para subir a montanha (e sobretudo descer, porque uma descida tão íngreme exige um cuidado e atenção redobrada) foi uma aventura inesquecível. Mas está feita! E tive a sorte de usufruir de um dia fabuloso, um céu azul intenso, sem nuvens. Claro que fiquei com dores em todos os músculos do corpo e nos dias seguintes praticamente não conseguia andar (falta de treino), mas valeu a pena todo o esforço! 

Reine é um lugar idílico, parece o cenário de um filme de fantasia. Aliás, as Lofoten no geral são um lugar muito especial, distante e, também por isso, muito preservado e em equilíbrio perfeito com o homem. Espero regressar, um dia, talvez noutra estação do ano para fotografar outras cores. Cada viagem é única, podemos até ir várias vezes ao mesmo lugar, mas a viagem será sempre diferente porque as experiências podem ser outras e os dias nunca se repetem. Quero mesmo voltar, talvez no inverno, para fotografar este paraíso pintado de branco.


Para mais tarde recordar: como fotografar auroras boreais?

Vai precisar de uma camara fotográfica que permita fazer fotografia em modo manual, tripé, paciência e roupa quente para o frio. Na maior parte das fotografias de auroras a cor fica bastante mais intensa do que aquilo que é na realidade, isto porque se trata de uma longa exposição. Com o ISO entre 1600 a 3200, uma abertura máxima de 2.8 e o tempo de exposição poderá variar entre 2 a 20 segundos, ou mais, tudo depende da luz que existe nessa noite (por exemplo, se existe luar) e da intensidade das auroras. Um comando disparador também pode dar jeito, para evitar pequenos movimentos na camara. No entanto, este último pode ser contornado através da programação do disparo com o temporizador. A técnica não é difícil, mas requer alguma paciência. E as noites podem ser bem longas e frias, mas inesquecíveis!

Na minha página de Instagram, pode rever alguns momentos fotográficos desta viagem através do hashtag #lofotenparaisodoartico

Só boas memórias da comida. Destaco o abundante pequeno almoço do Thon Hotel, em Svolvaer, onde vários tipos de peixe fazem parte do menu.

O custo de vida na Noruega é bastante elevado. Estas são algumas cervejas que pode encontrar, mas prepare-se para pagar cerca de 5 euros por lata.

A cabana 23 de Eliassen Rorbuer, na ilha de Hamnøya foi a minha casa durante 3 noites. Uma cabana com esta vista... Que mais se pode querer?

Não fosse a temperatura ambiente e da água, diria estar numa ilha paradisiaca. A água transparente e gelada do Círculo Polar Ártico, na ilha de Hamnøya.

Plantar jardins no telhado é tradição nos países do norte desde a Idade Média. Além de integrar as casas na natureza, protege da chuva e do frio.

Foi na cabana 22 de Reine Rorbuer, em primeiro plano na imagem, que fiquei durante duas noites e registei a minha primeira aurora boreal.

Pior do que a subir, é mesmo descer a íngreme encosta de Reinebringen, mas a vista compensa o esforço. Não se esqueça de levar água.


 

ⓒ O Viajante Aprendiz - Portfólio fotográfico de António José Ribeiro